Aqui estou, sentada a sua
frente, fitando esses olhos castanhos de um escuro tão profundo e intenso que
eu chamava de lar. Eu costumava compreender essa escuridão e enxergar as coisas
que se escondiam no meio dessa névoa densa. Eu costumava enxergar a sua alma
perdida na incoerência desse olhar e navegava sem pudor nos mares revoltos que eles traziam. Mas hoje… hoje o que resta é apenas um par de olhos
castanhos escuros que não me permitem ver absolutamente nada. Me olham, mas não
me adentram, se encontram com os meus, mas não conversam comigo, se tornaram
desconhecidos e inconstantes, como se nunca tivessem me amado.
Quando
foi que nos perdemos? Quando foi que deixamos de ser compreensíveis um ao
outro? Quando foi que meu olhar deixou de conversar com o seu? Que ele deixou
de sorrir ao encontro do seu olhar? Será que o sua alma se escondeu de mim? Ou será
que seu olhar encontrou outro olhar? É indecifrável, o brilho está apagado e agora
que não vejo mais nada, se tornou impossível saber o que agita sua revolta
interior. Gostaria muito de entender, aqui, olhando pra você, em qual esquina
da vida você me deixou, em qual mar de
gente a sua mão soltou da minha e não conseguimos mais encontrar o caminho para
casa.
Sua
expressão perante a minha é falha, é desconhecida. Você costumava sorrir ao me olhar, costumava segurar a minha mão enquanto caminhávamos na calçada.
Fazia café e se preocupava com que horas eu ia chegar. Costumava ser o que não
é mais. As mãos são as mesmas, o rosto é o mesmo, o cabelo desalinhado e a
barba por fazer são iguais, mas o olhar, esse por mais que sejam da mesma cor,
não possuem mais o mesmo brilho de antes, não vejo mais o meu reflexo neles,
não vejo a coleção de momentos passarem, vejo apenas um par de olhos
que olham para o nada, o nada que eu me tornei.
Continuo
sentada a sua frente olhando esses olhos, tentando me encontrar de alguma forma,
tentando entender quando foi que eu deixei de ser visível a eles, talvez não seja possível mais
adentrar a escuridão do seu olhar, nem saber o que te aflige, mas ainda te vejo.
E continuarei te vendo, mesmo que nem lembranças de mim, restem dentro dos seus olhos.